Vida Tropical


Tenha calma, brasileiro, afinal, o medo dura pouco. Logo, os motins, os baleados, os ônibus e agentes penitenciários carbonizados sumirão. Então, nos esqueceremos do pesadelo paulista, nos voltando à pacífica vida tropical que merecemos. Pois, costuma ser assim: ao brasileiro não cabe rememorar as lembranças ruins. Tudo sempre passou e sempre passará.
São Paulo assistiu ao massacre do Carandiru, quando mais de cem detentos rebelados foram assassinados pela polícia. Não se viu punição, nem mesmo reformas em nosso regime penitenciário capenga. Logo depois, veio Vigário Geral, onde um grupo de policiais encapuzados chacinou mais de vinte moradores da favela fluminense. A condição das favelas vem se deteriorando e os policiais cariocas, hoje, são tão confiáveis quanto os traficantes que supostamente combatem.
Em Carajás, há dez anos, quase duzentos policiais saíram disparando contra ocupantes sem-terra, dezenove deles foram mortos. Mais uma vez, não se viu punição. A questão agrária empoeira abandonada entre a nossa displicência e o mofo, e os sem-terra, igualmente abandonados, são vítimas da pobreza e de seus líderes oportunistas.
A Justiça teima em abrandar as penas de criminosos que (por um mês) deixam a população chocada. A indignação logo se esmorece, e bastam bons advogados ao assassino ou ao colarinho-branco para que escapem da punição merecida. O próprio eleitorado acaba por inocentar o corrupto que rouba, mas faz, e o contribuinte se acomoda ao ver nossos juízes-lalaus dormindo em suas próprias camas, já que não se pode fazer nada.
O Brasil passa por sucessivos casos de corrupção política, mas faz questão de esquecê-los. Ao congressista acusado cabe cair no ostracismo por três meses para voltar como uma figura renascida, um homem público livre de qualquer suspeita. O PT, marco da corrupção em proporções universais, está para se reeleger. Tudo sempre passou e sempre passará.