Começa-se por esperar num ambiente conjugado invadido por um sol impiedoso disputando qualquer canto com outras vítimas afortunadas (ingênuas ou sádicas), que se amontoam como etíopes subnutridos em frente ao acesso principal, de onde se vê famílias se esbaldando freneticamente em cada um dos pratos mais exóticos, para depois jogar suas panças para debaixo da mesa enquanto se segura uma xícara irrisória, ignorando os clamores silenciosos do garçom, que deseja faturar com aqueles que aguardam famintos do lado externo.
Senhoras que exibem quilates às dezenas não deixam de cerimônia e, entre gargalhadas aflitas, tratam de chafurdar em seus pratos – cientes do desespero que as cercam, esforçam-se por exibir seu regozijo de forma dramática. Cadeiras se chocam contra mesas e traseiros desavisados fazendo trepidar um naco de javali; serventes se esquivam com perícia e angústia de homens gordos que exibem um penduricalho eletrônico para cada reentrância de seus trajes sempre iguais.
Já postos em nossos lugares, vemos que não há porto-seguro entre tanta tormenta: como se fossemos nós as vítimas do forno predatório, esprememo-nos entre os burgueses que se confundem inscritos num aro de conveniências ardoroso. E somos arrastados por travessas que amparam cadáveres de animais que eu não sabia ser passíveis de se tragar; mergulhamos em caldos e nos untamos com óleos viscosos, mastigamos violentamente, num silêncio exasperado por toda comoção que nos cerca.