Paraíso Ideal

Ut quemque Deus vult esse, ita est

Ciência e toda religião coincidem numa única especulação: multiplicai-vos. E isso porque tudo de efêmero almeja ser eterno, e aos homens não há subjetivismo ao deixar um suplente à comunidade desfalcada - ainda mais ao tratar de deixá-la mais eficiente à sua prole, e adaptar tal progênie para que persista em seu rumo. A meus olhos, então, o conceito de um Paraíso além-vida à espera dos cidadãos disciplinados de uma dita sociedade acaba por antagonizar com a própria existência humana.
Por imaginar que a esperança do conforto post-mortem fora criada como compensação à vida de limitações em nome da comunidade meus argumentos soavam como mera provocação. Mas, se nos imolamos em busca de um sentido para tudo, contentamo-nos com um apenas. E, hoje, vejo que ao viver para a sociedade, sua manutenção e seu porvir, não preciso de outro prêmio que não partir conformado com minha atuação social. Logo, só me resta crer que o Paraíso não foi talhado como recompensa pela austeridade em vida, e sim pela anuência à instituição religiosa.
Todo Éden não passa de uma artimanha engenhosa que confronta aquele que vê esvair sua fé em tal igreja. Dito isso, proclamo minha redenção. Pois, se não tenho minha bestialidade limitada por dogmas, ainda sim conheço a moral da sociedade que habito, e por conhecê-la ainda melhor posso dizer que transbordo seus limites, agindo com mais rigor do que se faz necessário. Se não ajo bem por meu próprio conforto eterno, vejo num rumo sensato e ético um passo a menos entre a distância do mundo de meus descendentes e o tal Paraíso.